domingo, 3 de abril de 2011

Órfãos da colheita


            A fome e o desemprego estão obrigando meninos e meninas de quatro anos de idade a trabalhar mais de dez horas por dia como bóias-frias da colheita de algodão do município de Querência do Norte, no Paraná. Eles são chamados de “órfãos da colheita” pelos demais bóias-frias. Trabalham sem seguro e garantias trabalhistas e vivem pendurados nas carrocerias abertas dos caminhões.
            “Eles andam apertados em caminhões, sem nenhuma segurança, conduzidos por motoristas sem carteira de habilitação e, às vezes, trabalham mais do que os próprios adultos”, disse o presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Agricultura de Querência do Norte, Antônio Norberto Possi.
            Os órfãos da colheita são reunidos pelos chamados “gatos”, encarregados de providenciar os trabalhadores. “Temos de levar as crianças porque as mães não têm creches onde deixar os filhos, então os meninos são obrigados a crescer nas plantações”, disse o “gato” Edvaldo Ferreira.
            D.M., de seis anos, sonha em juntar dinheiro para poder ter novamente uma bicicleta. A vida de D.M. não difere da maioria dos meninos de sua região. Ele acorda às quatro horas todos os dias e segue na carroceria de um caminhão para trabalhar na colheita do algodão.
            Ele acompanha a mãe, a bóia-fria Marine Moura, de 35 anos. “Ele é meu protetor: chega a colher quarenta quilos de algodão por dia”, diz a mãe.
            Quando tinha três anos, D.M. chegou a ter uma bicicleta. A mãe teve de vendê-la para comprar uma passagem com destino ao Paraná.
            Ele não sabe o que é o Natal, nunca foi à escola. Entre os poucos prazeres que conhece, está o de tomar sorvete. Ele se alimenta diariamente de arroz e batata.

DIMENSTEIN, Gilberto. Órfãos da colheita.